segunda-feira, julho 11

Caso Chato...

Pacientes de um consultório de psicanálise, Rodrigo e Cecília dividem o ambiente da recepção semanalmente. Desse hábito necessário, surge uma amizade duradoura, onde eles compartilham as graças, desgraças e transformações de suas vidas. Tal é a fábula do espetáculo CASO SÉRIO, com texto de Cláudio Simões e Margareth Boury; com direção de Cláudio Simões e Celso Jr.; apresentando no elenco o próprio Celso Jr. e Andréa Elia.
Vi no Sesi Rio Vermelho, um teatro desconfortabilíssimo, cujas cadeiras flagelantes maltrataram minhas costas em uma hora e meia de peça.
Papo de Terapia e muito ‘almanaque de cultura’ é a receita usada pelo autor, diretores e atores, numa tentativa de provocar no público enxurradas de riso e umas pitadas de dramaticidade politicamente correta. E já que “a franqueza nem sempre traz coisas desagradáveis”, o espetáculo Caso Sério cansa. Não chega a ser nem ruim nem bom. Mas cansa.
O texto de Claudio Simões não é dos piores. Conta com pérolas de sensibilidade, alguns ótimos momentos de diálogos e outros toques de um dramaturgo interessante. Porém a situação dramatúrgica proposta por ele, apesar de ser simples do ponto de vista estrutural, já nasce eivada de muitos riscos quando de sua transposição para o palco. Sem dúvida alongar por noventa minutos uma trama que se dá entre um sofá e um bebedouro de água, contando somente com dois personagens que, salvas algumas variações, conversam sobre o mesmo assunto todo o tempo, é confiar demais no trabalho da encenação, na interpretação dos atores e na complacência do público.
A encenação, por sua vez, não conseguiu sanar as deficiências do texto nem acrescentar-lhe nada de interessante ou original. As opções de narrativa feitas pelos diretores abusaram da repetição, caíram em monotonia e, após os primeiros trinta minutos, foram provocando aquele já conhecido cansaço e desinteresse no público. A cenografia, além do básico, possuía ao fundo um móvel estranho e grandemente desproporcional, uma espécie de grande prateleira com alguns objetos, que, na maioria do tempo oculta, por uma cortina meio opaca, tinha por vezes algum de seus compartimentos iluminado por um refletor frontal que lhe revelava algum elemento. Mas confesso que sai do teatro sem entender qual a verdadeira função cênica ou semântica do móvel, ou se de fato ele era parte dessa peça ou quem sabe componente de cenário de outro espetáculo. Portanto neste ponto decisivo, a cenografia de Rogério Mercês é muito confusa. O desenho de luz de Eduardo Tudella é básico. A luz que incide nos personagens, na boca de cena, no momento de seus apartes, é muito problemática. Difícil fazer luz no teatro Sesi. Quanto aos figurinos, os primeiros da personagem Cecília são verdadeiramente horríveis, se este foi o objetivo, acertaram! Já as vestimentas do Personagem Roudrigo, que, segundo ele próprio, são como se fossem de adolescentes, combinam-lhe bem. Mas desconfio que façam parte do guarda-roupa pessoal do próprio ator Celso Jr. Fato curioso, porque seria um notável resgate, por parte de nosso teatro baiano, de um estilo de composição visual e psicológica fundamentada pelo grupo Living Theatre. Da maquiagem não há nada de relevante a ser tocado. A sonoplastia segue na já aludida linha de ‘almanaque de cultura’.
Chegando na interpretação. Alguns teóricos que falam sobre o trabalho do ator afirmam que no ocidente existem pelo menos três tipos fundamentais de interpretação. A saber, a interpretação onde o ator constrói o personagem e se identifica psicologicamente por inteiro ao encarnar o mesmo; um outro tipo seria aquela onde diferentemente o ator distancia-se do personagem, a moda do teatro épico, procurando propositalmente o ‘estranhamento’; e por último seria o estilo onde o ator, conscientemente, diante de qualquer papel, situação ou dramaturgia passa a vida inteira interpretando a si mesmo. São estilos, o freguês escolhe o sal a gosto. Parece que Celso Jr. vem escolhendo, pelo menos nas peças em que eu estive na platéia, interpretar orgulhosamente a si mesmo. É um bom ator, em cena sabe perfeitamente o que deve ser feito, é ótimo nos tempos, no domínio do olhar, mas mantém o vício de não transformar os seus personagens em ninguém além dele mesmo. Com Rodrigo, mais uma vez Celso funciona, mas não convence. E olha que ele nem faz telenovela. Andréa Elia, de início, parece estar com muita pressa de resolver cada unidade da peça, acelera muito em suas falas, e assim nessa altura compromete a matéria prima desse espetáculo que é o diálogo. Não está perigosamente mau, mas parece estar presa, limitada por algo, como se não soubesse andar com os pés de Cecília, sentar como Cecília, respirar como Cecília. Não se nota na interpretação de Adréa Elia aqueles gestos pequenos, sutis e involuntários que caracterizam a riqueza de um corpo humano. A impressão dada é que ela não pensou a personagem. É preciso lembrar que o personagem é humano. O teatro do Sesi possui péssima acústica, por vezes, é muito difícil escutar a ambos os atores.
‘Caso Sério’ não é emocionante. Não é engraçado. O texto como está e como foi encenado, não fala de amizade, nem de amor. É antes um emaranhado de conversações e depoimentos, sobre vidas de gente tão desocupada e tão sem profundidade, que chegam a lembrar aqueles tediosos e tristes burgueses da Belle Époque. E se dizem “que a solidão tem remédio”, o teatro, sem dúvida, quando bom, pode ser o próprio remédio para centenas de pessoas numa noite de sábado. Eu estive no teatro Sesi e me senti solitário.

Espetáculo visto no dia 09 de janeiro.
Hedre Lavnzk Couto

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