quarta-feira, agosto 25

'Zeca Camargo é minha mula’

Numa época não tão distante tinha sido ele um jovem arquiteto de talento arrebatador. Casou-se com Mal, uma mulher fascinante. E passaram a dividir entrei si não apenas o carinho de um pequeno casal de filhos, mas também a paixão por uma inusitada técnica que lhes permitia adentrar por profundas experiências oníricas. Havia entre eles um amor de tal grandeza que o mundo real não mais lhes bastava. Precisavam de um lugar próprio, de um mundo particular. Aperfeiçoaram então suas técnicas, e tornaram-se obcecados pela idéia de abandonar a realidade, e entregaram-se à rotina de adormecer e se auto induzirem ao mundo dos seus sonhos. Lá, formaram um casal de deuses, criaram e materializaram mares, ilhas, cidades com avenidas ladeadas por arranha-céus improváveis e casas resgatadas das memórias de suas infâncias, tinham quais e quantas profissões quisessem, realizavam as viagens que desejavam, podiam controlar o clima e o tempo, eram senhores de sua felicidade, um mundo onírico confusamente mais real do que o real, projetado com a força do pensamento.
Porém, quando despertavam de volta ao mundo real, este já não parecia tão real, de modo que o mundo que criaram dentro dos sonhos parecia ser mais coerente, mais palpável, desejável. Com o passar do tempo Mal perdeu o controle e tornou-se dependente das imersões oníricas. Lançava-se nos sonhos e de lá não mais queria sair. Dom percebeu que a obsessão da esposa progredia perigosamente. Num dos sonhos, Mal se recusava a voltar para a ‘superfície’ e passaram tanto tempo sonhando e vivendo naquele mundo, que ambos acabaram mergulhando num nível mais profundo chamado – Limbo, onde chegaram a viver toda uma vida, envelhecendo juntos. À medida que se demoravam em tal dimensão, aumentava-se o risco de que eles não mais conseguissem acordar, foi quando Dom resolveu que era preciso ‘plantar’ uma idéia na cabeça de Mal: induziu-a passo a passo a questionar a realidade daquele mundo que ela julgava indiscutível. Acordaram.
De volta ao mundo real, depois de tanto tempo sonhando, Mal se torna perturbada. Desenvolve a idéia fixa de que o mundo real não é real e tenta persuadir Dom da necessidade de se matarem os dois, para que assim possam despertar na verdadeira realidade. A vida do casal enlouquece, Mal afirma que os filhos não são reais, e, sim projeções de suas mentes. No dia do aniversário de casamento, numa última tentativa de convencer Dom a cometer o duplo suicídio, como esse não concorda, ela joga-se do alto de uma janela. Para puni-lo, deixa uma carta, onde afirma que vinha sofrendo ameaças do marido e que temia por sua vida. Dom torna-se o principal suspeito do crime. Foge dos EUA. Foragido, torna-se acusado, e impedido de voltar a viver com os filhos...
...Erra de continente a continente. Não é mais arquiteto nem de seus próprios sonhos. E como não lhe restando outra opção, recicla suas habilidades com o subconsciente e transforma-se numa espécie de mercenário especializado em invadir mentes alheias. Com sua equipe, presta os mais clandestinos serviços para pessoas e corporações de todo o mundo. Seu verdadeiro trabalho agora é invadir a mente de determinadas pessoas, através dos sonhos, e lá plantar sementes de idéias, o que eles e seus colegas chamam de Inserção.
Por outro lado, Dom é um completo infeliz. Trabalha com único objetivo de conseguir comprovar sua inocência e voltar para casa, voltar para os seus filhos. E, quando tal objetivo parece ser inalcançável, surge uma proposta: um poderoso magnata deseja que ele faça uma inserção na mente do herdeiro do seu maior concorrente, e lá plante a semente da idéia “não seguirei os passos do meu pai. Venderei todos os negócios.” Aparentemente, surge a grande oportunidade através da qual Dom encerrará seu exílio involuntário, só que, para realizar esta tarefa ele precisará vencer diversos desafios, e o maior deles são as lembranças de Mal, que corroem sua mente como um vírus. Além disso, ele e sua equipe precisarão ir até a perigosa zona do Limbo.
Buscando A Origem...
“Cheio de arrependimentos (...) estou esperando alguém. Alguém de um sonho esquecido (...) morro de saudades de você. Mas preciso deixar você ir. Nosso tempo já passou (...) porque você não existe. Olha só pra você, é só uma sombra (...) nos meus sonhos você ainda está viva. Mas não são sonhos, são memórias” – são algumas falas de Dom. Na busca da Origem é preciso saber que a menor semente pode crescer dentro de uma cabeça e se transformar numa idéia, que pode crescer feito um câncer e te destruir. Dom é um homem alquebrado porque plantou na própria mente a semente da idéia de uma culpa. Não se perdoa por ter iniciado Mal nas navegações da mente; menos ainda por um dia ter-lhe plantado a semente da idéia do questionamento; nem por ter sido covarde quando resistiu e não pulou daquela janela com ela. Ele só queria voltar no tempo e recuperar a vida que perdera; a mulher que amava, os filhos amados que ficaram para trás. Logo Dom que sempre quis uma vida, e através dos sonhos a projetou em sua acepção mais plena, agora não tem vida alguma, precisamente sequer existe, e teme morrer sozinho. Por telefone, o pequeno James lhe pergunta: “quando você voltará para casa, papai?” e Dom responde, - “breve, filho” – mas ele sabe que talvez nunca retorne, porque Mal mora em sua mente, e mesmo morta, está viva e causando danos como nunca, tentando ainda o convencer a abandonar tudo metendo uma bala na cabeça, para encontrá-la do outro lado. Mas entre a culpa e o amor, Dom opta por tentar voltar a ver os rostos de James e Phellipa.
Um filme jamais é feito para ser entendido, jornalista Zeca Camargo. O mais importante não é aquilo que pode ser explicado, e sim a sensação. Diante do filme que vemos na Telona, cada um de nós nos ‘identificamos’ à nossa maneira, e criamos relações, interações e projeções entre a história que está sendo narrada e as nossas próprias experiências emocionais; de forma que não precisamos ter essa obrigação falsa-inteligente de entender patavinas dentro do cinema; tão somente basta que nos permitamos que a película nos desperte algo na alma. E se nos sonhos criamos e percebemos de forma simultânea, e se a arte é um sonho, tal é o cinema.

E com certeza A Origem cumpre bem essa nobre missão. Quando se tira todo o ‘casaco de pele’ dos efeitos de computação gráfica e daquilo que eu chamo de ‘ficção onírica’, sobra um roteiro correto, com diálogos banhados com refinados toques de humor. Um elenco agradável de ver, equilibrado, trazendo Leonardo DiCaprio em performance inspirada. Além das brilhantes atuações de Cillian Marphy na pele do Robert Fischer, e da Ellen Page, encarnando a Ariadne. Entretanto, existe algo de assombroso, de impressionante neste filme, e chama-se Mairion Cotillard. Magnífica atuação! Os olhos dela interpretando a Mal é algo para se guardar na memória. A partitura corporal da Mairion criada para esta personagem é uma aula para quem pretende ou se diz ator ou atriz. A interpretação da Mairion Cotillard neste filme é um sonho de três níveis: tão cheia de complexidades quanto um sonho dentro de um sonho dentro de um sonho. Depois de ver algo assim, difícil é resistir ao Limbo! Vou embora para o Limbo. E ela acerta em todos os filmes: esteve maravilhosa e precisa na pele de Edith Piaf. Esteve deliciosa em Nine fazendo a mulher do protagonista. A música do filme não tem nada de espetacular, mas é muito competente. A direção mostrou-se muito criativa, ao eleger como toque dos chutes (momentos onde os personagens eram acordados, sincronizadamente, ao longo dos vários níveis do sonho) a música ‘Non, Je Ne Regrette Rien’, de Edith Piaf, e os versos “Non... rien de rien...Non... je ne regrette rien… Ni le bien qu'on ma fait, Ni le mal - tout ça m'est bien égal!” que vem a calhar como uma inteligente ironia para o conflito do protagonista envolto pelo sentimento da Culpa. Quanto a última imagem do filme, o objeto girando em cima da mesa, eu jamais divido escova-de-dentes. Paradoxo. 11 minutos, Tempo Real.

Dedicado a minha mãe. Porque, por mais que a ame, ainda não sou o bastante.

Hedre Lavnzk Couto.

quarta-feira, agosto 18

'Vincere'(?)

Quando uma mulher ama um homem, olha-o com olhos esbugalhados. Porque deseja engoli-lo, guardá-lo e devorá-lo dentro de seu ventre. Na cama, enrosca-se no sujeito, e, invariavelmente, tem orgasmos múltiplos. Mas não pára por aí, quando admira um homem, os sonhos e aspirações dele transmutam-se em seu próprio projeto de vida. Escuta-o, deveras entusiasmada, falar de seus ideais, de suas frustrações e de seus, sempre ridículos, desejos de dominar o mundo. Pior. Esta mulher, amando, é capaz de vender tudo que possui para financiar àquele as utopias mais irresponsáveis. Já quando preterida por outra, e renegada por ele, anula-se, enlouquece e morre.
Milão, Itália. 1914. Ida Dalser é uma bela modelo. Numa tarde, da calçada, avista no meio da multidão, em passeata, um homem que lhe desperta um sentimento arrebatador. Apaixona-se naquele instante pelo jovem e espalhafatoso Benito Mussolini. Líder do Sindicalismo, membro radical do Partido dos Trabalhadores, Benito é nesta altura um mero diretor de um ‘impresso político’. A velha Itália anda agitada, nunca fora uma Nação propriamente. Ainda carrega o fardo caótico de, historicamente, seu desenho territorial-político jamais ter configurado uma Unidade. A idéia de ‘Itália’ é novidade, neste momento o sentimento de ‘Povo Italiano’ é algo perigosamente inicial, os velhos Ducados, Pricipados, Papados e Reinos se encontram há pouco tempo sob a batuta de uma Monarquia centralizadora, e da Igreja ainda bastante influente. Experimenta-se uma incisiva Campanha Nacionalista. Quer-se transformar um mosaico cultural e lingüístico em um Povo, que ver-se forçado a abadondar seus milenares dialetos para falar o Italiano. Em paralelo, ora inventa-se parte da história, ora costura-se parte dela, exaltando-se e exumando-se os feitos dos Grandes Pais da Itália, primeiros a pensar a Unificação.
Contudo, as insatisfações e conflitos internos são em número muito superior aos bons resultados, de faixada, ostentados pela Monarquia. A máquina administrativa é falha, os impostos são exorbitantes, não se consegue produzir, há desemprego e fome. O Movimento do Proletariado cresce em força em toda a Europa. Em uma palavra, a Itália é uma bomba-relógio. E eis que explode no dia 28 de junho, com um tiro que vem de Sarajevo, que lá mata o arquiduque Francisco Ferdinando da Austria, fato estopim da Primeira Grande Guerra Mundial.
Benito Mussolini nesta data já tinha fundado seu próprio jornal, financiado pela venda dos bens da apaixonada Ida Dalser. Através das páginas de ‘Il Popolo d’Itália’ tornou-se forte o bastante para passar por cima da ala moderada do Partido Socialista, que vetava a entrada da Itália na Guerra, por considerar que a guerra jamais beneficia o trabalhador. Mussolini, todavia, já tinha força e queria o embate, organizou os Grupos de Ação Revolucionária, e em 1915 os Italianos partiram para o front. Em 1917, Mussolini retornou ferido e glorificado. Continuou editando seu Jornal e atacando de maneira cada vez mais violenta os Socialistas. Em 1919, fundou os chamados ‘Grupos de Combate’, movimento de ideologia socialista-nacionalista que pregava a abolição do Senado, a instalação de uma nova Constituinte e o controle das fábricas por operários técnicos. Em 1921, Mussolini foi eleito para o Parlamento, estava criado o Partido Nacional Fascista. Daí então a ascensão total do Duce ao poder ocorreu de maneira avassaladora. Em 1922 ele organizou uma marcha contra Roma, chantageou o Rei Vitor Emanuel, e recebeu desse, carta branca para formar um novo governo. O Parlamento, cooptado pela força do futuro ditador, conferiu-lhe plenos poderes. Em 1925, instaurou-se a Ditadura Fascista, que só chegaria ao término em 1945, com a morte de Mussolini por Fuzilamento.
Fascismo! Figuras como Benito Mussolini surgem em momentos de grandes depressões sociais e, camuflados em peles de salvadores da Pátria, de Méssias, de grandes homens que sacrificam suas vidas e suas individualidades em prol dos semelhantes e do Bem Comum, alcançam o poder e o resultado é catastrófico para seus concidadãos. Tal qual muitos outros líderes, tragamos à baila alguns populistas atuais sul-americanos - Mussolini ao revés do que muitos se deixam enganar, era antes de qualquer outra coisa um maníaco egocêntrico, movido por um projeto pessoal de poder, conta-se que ele dizia que almejava ser maior que Napoleão. A personalidade pérfida do Ditador fica evidente nos pilares e pressupostos guiadores de sua doutrina Fascista: o Regime Fascista era totalitário; ditador; o Nacionalismo preconizado, tal qual o da Alemanha, era agressivo, impulsionado pelo fetiche do militarismo, do imperialismo, pelo culto do chefe, pelo anticomunismo e pelo corporativismo. Na perseguição de sua megalomania, Mussolini instalou na Itália um regime de Partido Único, Direitos individuais dos Cidadãos passaram a ser ignorados, o Parlamento foi transformado num simples órgão consultivo, criou-se a polícia política e a oposição sofreu repressão violenta.
A histórica é cíclica, repete-se, inclusive em continentes diferentes. Muito se fala em Neo-Fascismo. Ou em análises mais corriqueiras emprega-se o termo Fascista de maneira a cunhar determinadas posturas de alguns governos ou Estados, ainda hoje deslocados da urgência da realidade democrática Global. Mas se de uma parte é evidente que o Fascismo, exatamente como ocorreu na Itália, não mais existiu, de outro tanto, podemos facilmente comprovar que em alguns Estados ou governos ainda podemos apontar muitas das práticas levadas a cabo pela doutrina de Mussolini.
Acompanhem-me a um breve passeio pelos oito anos de governo federal do PT. Antes nunca é demais lembrar, traçar paralelos históricos, no mínimo curiosos: Mussolini era líder sindical. Lula também o foi. Lula é o ícone do Partido dos Trabalhadores. Mussolini, idem. Passemos adiante: o Fascismo, desde os tempos de Mussolini tem a mania de pregar que inventou tudo; tem a mania de negar o passado explícito; para o Fascismo a história passa a existir com sua ascensão ao poder. Qualquer semelhança com a pública e notória frase do presidente do Brasil “nunca antes na história ‘destepaiz’...” é mera coincidência. O Fascismo de Mussoline fazia culto ao chefe; hoje no Brasil Lula é tão cultuado que conseguirá eleger sua substituta (uma desconhecida) no primeiro turno das Eleições. Se na máquina pública de Mussolini preponderava a corporativismo, o governo Lula foi aquele que mais aparelhou e loteou a máquina pública brasileira. À maneira do Fascismo, o PT se tornou na prática um Partido único no Brasil. Também como na Itália daqueles anos tristes, o Parlamento Brasileiro transformou-se num órgão consultivo (vide Mensalão). Da mesma forma como o fizeram os Fascistas, no Regime Petismo o Direito dos Cidadaos não são respeitados (vide quebras de singilos bancários e dados sigilosos, desde o caso do caseiro Francenildo, por ordem do ministro da Fazenda). Se os fascistas italianos perseguiam a Igreja, os petistas querem tirar os crucifixos das repartições, que lá estão pousados em harmonia nacional há séculos. Se Mussolini tinha sua polícia política, O Petismo tem a Polícia Federal e suas operações midiáticas ‘caça-pijamas’. Por tudo dito e comparado, é facilmente assimilado e comprovado, que hoje no Brasil vivemos sob um Regime de herdeiros diretos de Mussolini.

Analisando o filme ‘Vincere’...
... No geral assiste-se a um filme e verifica-se que a fotografia é extraordinária; ou quem sabe a direção de arte primorosa; o roteiro instigante; ou os diálogos vivos; os figurinos minuciosos e inventivos; a trilha sonora inspiradora; a interpretação inesquecível, a direção cuidadosa; enfim, constatar e elogiar a plenitude da concepção e execução de um ou mais elementos que constitui o objeto artístico ‘filme’ é habitual, mas o inusitado, o mais prazeroso e surpreendente é quando nos deparamos diante da grande tela com o Melhor Cinema. E melhor cinema, leitores, é ‘Vincere’! Absolutamente! É um filme digno de entusiasmo. Todos os aspectos do filme estão maravilhosamente adequados e emocionantes.
O roteiro de Daniela Ceselli e Marco Bellocchio é merecedor de a platéia levantar-se para aplaudir. O próprio Marco Bellocchio realizou a direção e isso foi importante, porque só um diretor roteirista e um roteirista diretor poderiam ter ousado tanto. Coragem é a palavra para brindar o talento e o momento impar da inspiração dessa direção. Bellocchio não tem medo de experimentar no filme. O diretor parte de um roteiro baseado em fatos históricos, mantém força dramática e o tom documental necessário, no entanto, ele nos presenteia com uma aula prazerosa de narrativa. Bellucchio, como que inspirado pelas mais ousadas e espojadas técnicas de narrativa do teatro épico, torna lírico, um filme que poderia ter-se tornado chato sob uma coordenação desatenta.
Em Vincere é cinema dentro do cinema. É metacinema. Com filmes do cinema mudo e cine-documentos oficiais daquela época, nos mostrando Mussolini em imagens, creio algumas inéditas fora da Itália. De logo, o filme nos causa impacto quanto a fotografia, no geral pouca luminosidade, uma atmosfera sombria na maioria dos 130 minutos de duração, como que a metaforizar o período de sombras vivido pelos italianos naqueles dias; quando a luz aparece, é artificial e irônica. Outro ponto fortíssimo é a música do filme. Pulsante, como a sentir os sangue circulando pelas veias da Ida Dalsor. Inteligentemente, uma das únicas cenas onde não há música, pelo menos não convencional, é a cena de sexo, em tempo real, entre Mussolini e Ida. Em tal cena, a única musica é produzida pelos corpos, pela respiração de Ida, que se intensifica a medida que vem o gozo, e de sua voz repetindo uma certa frase bastante usual. Bela cena.
A Ida Dalser interpretada pela Giovanna Mezzogiorno é uma úlcera. Ela é tão boa que sentimos a dor, o espírito desnorteado dela, ressaltado por aqueles dois olhos grandes de atriz de cinema mudo. Decisão importante, anote-se, foi a opção de não usar atores para interpretar o Mussolini na fase madura, usando tão somente as imagens verdadeiras do próprio Duce real.
O desfecho da Segunda Guerra salvou a Itália de Mussolini e de seus Camisas Negras. O que nos salvará do Lula e de seus Camisas Vermelhas?

Texto dedicado aos bons professores de História.

terça-feira, agosto 10

'Uma Noite em 67'

Renato Terra e Ricardo Calil fizeram um documentário modesto. Verdadeiramente muito aquém da riqueza do material de que dispunham: o Brasil do final dos anos sessenta, com todos os seus conturbados ingredientes culturais e políticos. Contentaram-se em apresentar ao público os bastidores do III Festival de Música Popular Brasileira da TV Record.
Para tanto, usaram a técnica de intercalar cenas originais dos bastidores e das apresentações dos cantores no palco com entrevistas atuais daqueles artistas, hoje 44 anos mais experientes. Esse subterfúgio, apesar de previsível, ainda consegue criar um interessante contraste estético entre as cenas em ‘preto e branco’, originais do passado, e as coloridas, atualíssimas. Um outro ponto de apoio do filme é a generosidade dos entrevistados, que, com muito humor e franqueza, nos conta não menos que ‘reliquiosas’ minúcias de seus estados d’alma naquele período. Chega a ser prazeroso ver Chico, Caetano, Edu, Roberto, e Gil, confessando detalhes de suas vidas e de suas opções naquele início de carreira. Foi gratificante. Meus desconhecidos companheiros da platéia e eu soltamos muitas gargalhadas. Mas por outro lado, também rolei algumas lágrimas escondidas, talvez motivadas pela nostalgia sugerida pela ausência de cores das cenas originais.
Eu sou um apaixonado por história, aliás, eu gosto de tanta coisa; mas o que interessa é que boa parte da história do homem, notadamente a partir do final do século 19, está conservada e nos é apresentada através do ‘filme’ preto e branco, seja por via da fotografia ‘estática’ ou em movimento. E não nego que me causa um imenso prazer ver cenas de velhos documentários em preto e branco ou mesmo passar horas envolvido por cenas de filmes antigos, ainda não banhados pela policromia. Gosto de preto e branco. O Vagabundo Carlitos, colorido, que lástima!
Os anos sessenta, peculiarmente seus derradeiros anos, foram cenário de agitações e transformações em diversos setores das sociedades do Ocidente. Este nosso recorte da civilização sofria uma revisão de seus valores, em conseqüência ainda das muitas seqüelas deixadas pela recente Segunda Grande Guerra, e agora pela Guerra Fria, e pelos muitos conflitos bélicos levados em muitos cantos do globo, os ocidentais pareciam assim buscar uma resposta para o significado ou o sentido de viver, daí a eclosão do Movimento Hippie, do Movimento Feminista, do fortalecimento, para muitos, ameaçador, do Comunismo, de todos os movimentos que berravam por liberdade, igualdade e paz, e aí surgia a sintomática rebeldia, estampada e ostentada através das artes, sobretudo através da música, bem como das drogas, da liberalização sexual, no privilégio do ‘hoje’ em detrimento da perda de tempo em se pensar no ‘amanhã’. O mundo parecia esquizofrênico. Talvez, estivesse neurastênico. EUA e URSS disputavam seguidores e apontavam suicidamente seus mísseis escatológicos um para o outro. O fim parecia certo. Em tempos assim, o melhor para muitos era cantar, viver um eterno ‘hair’, muito melhor do que ‘sentar-se no trono de um apartamento, com a boca escancarada, cheia de dentes, esperando a morte a chegar’. Mas, e o Brasil? Como estávamos nós naqueles idos?...
Em 67 o Brasil já tinha Brasília, além das dívidas deixadas por JK; por outra, já se fabricavam aqui alguns dois fuscas, o pau d’gua do Jânio já havia caído fora, tínhamos escapado por pouco da imprevisível escalada da dupla caudilha Jango e Brizola, aquela que pretendia ser em solo tupiniquin a versão da dupla Fidel e Raul, transformando o Brasil num “Cubão” – essa expressão não é minha. Enfim, tínhamos há pouco mais de 3 anos caído nas garras dos militares, não menos inconseqüentes. - embora persistam dúvidas de quem teria sido pior para o País, uma ditadura Janguista administrada pelos camaradas, ou os indisciplinados anos de Médici.
Em 67, a coisa por aqui começava a endurecer, e, loguinho loguinho, em 68, surgiria o AI-5, ferramenta implacável do Regime de exceção, que mostrava que entrava e não queria sair de cena tão cedo. Neste período a ditadura ainda se fazia tímida, acreditava-se que seriam marcadas eleições democráticas e que o poder seria devolvido a um Presidente civil, isso não aconteceu. Mas a pergunta que não quer calar-se: Desde a renúncia de Jânio Quadros, no início da década, onde estavam e a que se dedicavam os jovens brasileiros? Quais eram suas posições e conceitos políticos? Talvez uma parcela dos jovens, impulsionados certamente pela histórica pilantropia da prática política partidária de nosso país e, profundamente fadigados com o descaramento dos políticos no trato com a coisa pública, caíram na armadilha da ilusão das promessas do não menos inconseqüente e perverso Comunismo. Já uma outra soma considerável desses jovens era apolítica, ou por acomodação, ou por falta de acesso a informação ou formação.
Fato é que havia uma ameaça no ar, vários são os historiadores e analistas que catalogam evidências de que João Gular (Jango), uma vez não deposto, teria firme aptidão e objetivo de perpetuar-se no poder, transformando-se num inabalável ditador populista, chefe de um Regime Totalitário Comunista, e Deus sabe o que seríamos hoje enquanto Nação. Mas nunca é demais fazer um exercício de futurismo retroativo – parece contra-senso – mas é possível: o que se tornou a Rússia Socialista? Basta saber que nos anos do maníaco Stálin qualquer camarada seu, ao passar pelas ruas e avistar qualquer bela mulher que lhe despertasse desejo, podia jogá-la dentro do carro e estuprá-la; ao final, com sorte ela podia voltar para sua família com vida, mas já sem dignidade, a maioria matava-se. Vejamos outros exemplos, o caso notório da parte do território Alemão que ficou décadas sob tutela dos socialistas, aquela que viria a ser a Alemanha Oriental, com a queda do muro de Berlim pode-se verificar o quão arrasado se encontrava a parcela Oriental do povo Alemão. E o que dizer das falácias da Coréia do norte? De um Regime guiado por um maníaco que mata seu povo de fome? Ou dos presos políticos cubanos mortos aos montes, enquanto Fidel tornou-se bilionário com a venda de açúcar e tabaco? A China? Caso muito complexo. No início dos anos 60 estávamos fadados a cair numa ditadura. A dúvida residia apenas em saber se seríamos flagelados pelos Camaradas vermelhos ou pelos Milicos revanchistas, que queriam ferrar os “Casacas” (civis) desde a guerra do Paraguai.
Hoje em 2010, temos um Presidente populista. Temos um Partido Único que parece que irá se perpetuar por décadas no poder. Não Temos mais Oposição. Os conservadores de fato se esconderam. Os jovens, onde estão? No Primeiro debate entre os presidenciáveis desta campanha, perguntei a 50 estudantes de direito de uma faculdade se eles o tinham acompanhado, pasmem, nenhum dos estudantes tinha se dado ao trabalho. É Provável que Dilma se eleja. É provável que Lula volte em 2014. É provável que os EUA invadam o Irã. É sabido que um Povo paga por precisar de heróis ou Grandes Pais. Eu conversava com um amigo, hoje pela manha, que talvez a nossa geração – atuais 18 a 30 anos – seja a geração mais perdida de todos os tempos. E por quê? Porque tivemos tudo nas mãos, e sequer somos capazes de pensar e ler. Somos piores do que a ‘Geração Coca-Cola’, somos a ‘Geração Dilma Rousseff’.

Hedre Lavznk Couto

Texto dedicado a João Ubaldo Ribeiro, porque eu tento, mas não consigo brincar de anacolutos.